Depois de quase três anos sendo adiada, a votação do Marco Civil da Internet deve ocorrer na próxima terça-feira (17) na Câmara dos Deputados.
Trancando a pauta da Casa desde outubro, o projeto pode mudar os rumos e a maneira como os internautas se relacionam e consomem a web. Confira mais sobre o histórico e as mudanças propostas.
Contexto e história
Considerada por muitos como “terra de ninguém”, a internet já lidera como principal meio de comunicação de grandes parcelas da sociedade.
Em recente pesquisa realizada pelo IBOPE, mais de 13% dos brasileiros admitiram usar a rede mundial de computadores como a principal fonte de informações e educação. Destes, quase metade afirmaram acessar sites e blogs diariamente.
Com o grande aumento no número de acessos, a quantidade de crimes e abusos também sofre elevação. Casos como cyberbullying, ofensas racistas, homofobia e até pedofilia enchem a rede e seus responsáveis, por muitas vezes, acabam escapando da lei.
Daí, em 2009, especulou-se a necessidade de criar uma espécie de Constituição da Internet brasileira, que serviria para esclarecer os direitos, deveres e princípios dos usuários e determinar como funcionaria a atuação do Estado no ambiente online.
Este é o chamado Marco Civil da Internet, idealizado no final de 2009 por legisladores, internautas, técnicos e estudiosos da área. Desenvolvido por quase dois anos em um debate aberto, o texto inicial do projeto acabou concluído em 2011, sendo apresentado na Câmara tendo como relator o deputado Alessandro Molon (PT-RJ).
Inicialmente tratado como um projeto para cuidar da defesa dos Direitos Humanos, o texto foi ampliado para outras áreas que, hoje, são tratadas como principais. Um exemplo é o conceito da Neutralidade da Rede, considerada um dos pilares do projeto.
Neutralidade da Rede
Na teoria, a Neutralidade da Rede considera que todas as pessoas com acesso a internet devem ter os mesmos direitos.
Ou seja, coibiria ações de provedores e operadoras que oferecessem planos de valores diferentes para limitar o acesso da rede – como uma modalidade mais barata para se acessar apenas o e-mail ou redes sociais.
Apesar de ser um dos pilares do projeto, o conceito de Neutralidade da Rede ainda é amplamente discutido. Considerado como o maior ‘inimigo’ do projeto, o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) classifica a medida como absurda e inconstitucional, já que impediria as empresas de oferecerem diversas modalidades de pacotes.
“Quem usa mais internet deve pagar mais, quem usa menos, paga menos. O modelo que defendo é o mesmo que se usa na conta de energia e água. Queremos neutralidade sim, mas sem aumentar o custo para o usuário. Não há almoço grátis” diz Cunha, que foi presidente da Telerj entre 1991 e 1993.
Já o professor da UFABC, Sergio Amadeu, acredita que o Marco Civil é uma atitude para combater a tentativa das companhias de telecomunicação de criar uma espécie de ‘apartheid’ digital.
“Enquanto no mundo inteiro tenta-se mudar o jeito que a internet funciona, o marco civil garante que a internet continue como é. Ao tentarem quebrar a neutralidade eles [representantes das operadoras] querem criar uma internet para ricos e outra para pobres” afirma.
Direitos Humanos
Outro ponto vital – e polêmico – no texto do Marco Civil da Internet é a seção IV, que trata sobre abusos e ofensas.
Inicialmente, a proposta trazia a possibilidade de remoção de um conteúdo que fosse denunciado para, só depois, ser julgado pela Justiça. O escrito foi amplamente criticado por causa da possibilidade de, em casos extremos, agir como censor.
Após sessões de debate sobre a cláusula, o texto foi alterado, chegando a fase atual, onde os provedores só serão obrigados a remover o conteúdo quando ordens judiciais forem expedidas – com exceção de casos onde o crime é claro, como em situações de crimes de intolerância e pedofilia.
O Marco Civil também trata de outras questões que abordam o convívio diário dos internautas, como a vedação do anonimato e a proibição da retenção de dados, como o histórico de sites acessados, se tornando acessível para as empresas apenas para casos de investigação policial com ordem judicial.
Desde que foi levado a Câmara, em 2011, o projeto de lei do Marco Civil nunca foi votado, tendo sido adiado por nove vezes.
Em setembro de 2013, após o surgimento de denúncias de espionagem por parte do governo dos Estados Unidos, a presidente Dilma Rousseff considerou a aprovação do texto como uma medida urgente.
Tentativa de combate à espionagem
O pronunciamento de Dilma sobre o Marco Civil também fez com que o texto fosse alterado. A partir daquele momento, o projeto passou a exigir que operadoras e provedores tenham seus bancos de dados em território brasileiro.
A medida seria, em tese, usada para combater e conter que dados de cidadãos brasileiros fossem vazados para outros governos, mas especialistas da área se dizem céticos ao acreditar que a ação impediria a espionagem.